COMENSAIS DO SILÊNCIO

 

 
Nem tudo o que se leva à boca nutre. Nem tudo o que é da boca alimenta. Um dia hão-de haver palavras sem sons que farão uma boa mesa, farta, a mais com conviva que chegue de surpresa ou que parta sem que se azede o pitéu que reste, uma terrina de verbo que console o olhar enquanto sorvido na colherada calma e sorridente, entrecortada por silêncios respirados no respeito de quem sabe o que come, aprecia e deseja a próxima refeição saborosa em tão boa companhia.
 
 

ENTREMEIOS DA SAUDADE

 

 
Do vermelho amadurecido pelo rei amarelecem agora as saudades no dourado da nostalgia. Não passou tudo, não chegou tudo, um limbo de ajuste às papilas que se esfregam num céu de boca a recordar palatos queridos e aconchegados às estórias.
 
...Isto faz-me lembrar o que eu  tanto gostava de...
 
 

DOURADO

 


No tom de mel, no tom de Outono, no sabor da nostalgia do Sol baixo que guardo no bolso da minha memória, os sucos doces que pacificam o frio da saudade ou o arrepio do adeus.

DAQUI A NADA...



 
Tempo de frutos que se enroupam para as tardes frescas, para as noites húmidas. Que saciam na frescura as manhãs ensolaradas a recordar o Estio no pretérito recente que logo, logo há-de a hora avançar no céu riscado a fogo, o apetite a outros paladares de mais aconchego, mais abraços.
 
 

EM BREVE



 
Conversar. Saborear-te os gestos falados em doses de pequena folia quando nas tardes imaginadas de um Outono que nos há-de chegar, contamos de coisas já idas e recordamos paladares comuns e bons de afectos que outros nos trazem, que outros nos dão as mãos sem o toque dos dedos. Nós tão perto, os lábios tão próximo. Porque o gosto de um é o gosto universal das memórias das corridas de braços abertos pelas encostas ou o rebolar louco das dunas ou ainda o tino perdido do baloiço. Nós tão perto neste calor de Agosto onde as folhas que principiam a amarelecer para aquecer palavras na próxima estação, conversamos, sonhamos, recordamos, velhos novos sabores.
 
 

CARÊNCIA



Vicios. A dependência de olhos semi-cerrados enquanto o coração desacelera na pulsação do reconhecimento do que lhe é familiar, doce, precisado, um achar que não tendo agora que voltou não mais da liberdade dirá palavra.
 
Há mais na ponta da língua do que o sentido saboreia. Também o verbo, venenoso.
 
 

ACORDAR





 
Quero tudo, tenho fome e sede e olhos e boca de falar e contar sorrisos, quero pão de todos os gostos que possa dizer regresso, abraços e casa e sentir a voz na lingua a vibrar canções antigas como alimento que sacia das saudades que partem como os que se foram. Mas sempre me deram o miolo na macieza do seu bem-querer.